Coisas da Tamonca

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Conceição do Coité, Bahia, Brazil
Pedagoga, Matemática, Mãe, Gestora da Escola Antônio Bahia-Conceição do Coité, Petista por enquanto, Amo LULA, luto por justiça, igualdade, odeio qualquer tipo de calúnia, discriminação ou preconceito. E vou vivendo... Música, poesia, livros, arte, cultura, internet, política e educação são minhas diversões. No mais o mundo é uma caixinha de surpresas, é só querer descobrir!

domingo, 21 de novembro de 2010

Refletindo a Lei 10639/03 no currículo escolar.

O currículo vivenciado pelos alunos vai além dos conteúdos escolhidos para serem ministrados pelos professores. A existência, na experiência escolar, de um “currículo oculto”, ao lado do currículo oficial, está confirmada por vários estudos sobre o tema. Silva (1999) discute sobre o conceito de “currículo oculto” como o conjunto de experiências não explicitadas pelo currículo oficial nos permitindo ampliar a reflexão sobre o tipo de mensagens cotidianas – traduzidas pelas páginas dos livros escolares, pelo preconceito racial entre colegas e entre professores e alunos – que são levadas ao conjunto dos alunos negros e mestiços. Ele inclui conteúdos não ditos, valores morais explicitados nos olhares e gestos, apreciações e repreensões de condutas, aproximações e repulsas de afetos, legitimações e indiferenças em relação a atitudes, escolhas e preferências. Em atividades propostas em sala, percebe-se o nível de exclusão traduzido no plano da violência simbólica a que estes alunos estão submetidos na sua experiência escolar. Nesta medida, uma discussão acerca do preconceito racial e das suas manifestações na sociedade e, em particular, na escola, precisa ser feita. Ela é imprescindível porque é preciso ampliar a compreensão do problema, para então se poder refletir sobre o que e por que deve ser escolhido como conteúdo para compor um currículo escolar que privilegie um direcionamento do olhar sobre os negros e mestiços na nossa história e cultura.

Ao tomarmos o currículo escolar como o conjunto de experiências pelas quais os alunos passam, o que nos permite agregar ao currículo oficial o currículo oculto, que é constituído por todos aqueles aspectos do ambiente escolar que, sem fazer parte do currículo oficial, explícito, contribuem de forma implícita para aprendizagens sociais relevantes, o que se aprende no currículo oculto são fundamentalmente atitudes, comportamentos, valores e orientações..." (Silva, 2001:78), ainda segundo Silva (2001), podemos também incluir na idéia de currículo, uma outra noção, que é a de currículo cotidiano, pois é no dia a dia que o currículo se realiza. Neste sentido, o grande desafio para qualquer professor é manter em sua prática cotidiana os princípios que, segundo ele próprio acredita, devem orientar a sua ação. É muito fácil deixá-los de lado em razão das inúmeras questões que aparecem na dinâmica escolar, desde dificuldades das mais variadas ordens relativas aos alunos e suas famílias até as que dizem respeito à estrutura da escola, a escolha dos livros e outros materiais pedagógicos ou o escasso tempo e orientação para a pesquisa e planejamento do trabalho. Enfim, o cotidiano nos enreda em tal armadilha que muitas vezes as boas intenções ficam em parte presas nas folhas de planejamento. O currículo, como já vimos, é um lugar de escolhas; ele não é neutro e precisa ser alimentado pela ação do professor.

Na medida em que estamos tratando de um conteúdo omitido, negligenciado e pouco conhecido pela escola e pelo professor, que é a restituição da presença e da dignidade da população negra como sujeito na história e na cultura brasileira, precisamos tomar cuidado para não cometermos uma falha pedagógica muito comum nas nossas escolas. Todo o projeto político pedagógico tem que ser alterado no intuito de contemplar as mudanças exigidas pela lei, isso tem que se dar de forma responsável e cuidados para que sua abrangência seja justa. Quando a sociedade de alguma forma dá mostras de que determinados conceitos ou valores estão em falta nas relações sociais, fica para a escola a função de resgatar e tratar os mesmos de forma ética e responsável. A mesma deve primar por executar ações e cuidar da perpetuação dos resultados obtidos, pois eles são quase sempre esquecidos, e o que se vê é o retorno às práticas anteriores. É muito comum o comentário dos educadores nas escolas dizendo: “De que adiantou tal experiência?” Com isso eles se referem às atitudes posteriores dos alunos em relação aos conteúdos contemplados nessas ações, que desaparecem de cena tão logo os eventos terminam. Contudo, embora esta constatação seja verdadeira, é preciso lembrar que ela é apenas parte da verdade, pois em várias situações as ações coletivas mobilizam e tocam alguns alunos individualmente. E é claro que, em algumas experiências mais integradas, esses projetos acontecem como ponta de lança e são incorporados ao cotidiano escolar.

A lei deixa nítida a obrigatoriedade do ensino de conteúdos sobre a matriz negra africana na constituição da nossa sociedade no âmbito de todo o currículo escolar e sugere as áreas de História, Literatura e Educação Artística como áreas especiais para o tratamento desse tema, tanto no Ensino Fundamental como no Ensino Médio. Entretanto, como já foi antes enfatizado, é preciso que estejamos convencidos da urgência e da importância de recuperar esse debate, na história da sociedade brasileira e nos currículos escolares. Pois, sem o pleno entendimento do por que desses conteúdos serem fundamentais, corre-se o risco de cumprir a lei burocraticamente e, com isso, reforçar situações de preconceito racial ao qual estamos submetidos. 

Por Mônica Ramos

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